O que você faz quando está de folga?
Antes eu viajava, agora eu leio.

Tirei duas semanas de folga das redes sociais e uma semana das aulas e traduções. Se você chegou no blog agora e ainda não conhece a minha história, dê uma olhada neste post.
No recesso eu coloquei a leitura em dia. Havia comprado alguns livros sem separar tempo para lê-los, estavam lá na estante solitários, mas me aguardando ansiosamente.
Algum tempo atrás falei sobre os melhores livros de viagem , mas hoje venho compartilhar com você minha experiência recente na literatura (uma viagem interior, por assim dizer) – 5 livros que achei fascinantes, cada um com suas peculiaridades.
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Vamos a eles?
- A metade perdida trata de questões raciais, mas não só.
O livro fala sobre duas gêmeas idênticas que resolvem fugir de casa. Na verdade, mais do que da casa elas desejam escapar da cidade minúscula onde moravam, daquelas que não existem no mapa e do destino que já parecia escrito, mas se delineava sombrio.

A trajetória de cada uma é diversa e elas se separam ao longo da jornada.
Em um determinado ponto se encontram em lados opostos de uma sociedade racista: uma delas se casa com um homem negro e se vê obrigada a retornar ao lugar de onde escapou tantos anos antes com uma filha que no mínimo destoava da cidade – sem lugar no mapa.
A outra assume uma identidade de branca, e o marido branco não faz ideia de seu passado. Nem as amigas que a rodeiam. Ela mantém o segredo bem guardado.
Ainda que separadas por milhares de quilômetros — e incontáveis mentiras —, o destino das duas irmãs permanece interligado.
E o que acontece quando os caminhos de suas filhas acabam se cruzando também?
Achei fascinante. Não desgrudei os olhos por nenhum minuto do livro.
Só leia!
2. Um lugar bem longe daqui é uma homenagem delicada a natureza. Um livro com mistério, ação e muito plot twist.

A menina do brejo, como é chamada a protagonista Kya Clark, sobreviveu sozinha desde os 10 anos de idade – até mesmo antes disso. Superou o abandono físico, mental e espiritual e se tornou uma mulher corajosa.
O tema central é o abandono.
O abandono é árido. Terra seca, rachada, sem vida numa ponte em que se lê rio das pedras. Vencer o abandono é um processo custoso e demorado. É aprender a florescer sem água, como mandacaru.
Kya foi abandonada pela mãe, que não conseguiu suportar o marido abusivo e alcoólatra, e depois pelos irmãos, a menina viveu algum tempo na companhia negligente e por vezes violenta do pai, que acabou também por deixá-la.
Ela mora no brejo e as gaivotas se tornam seus irmãos, o pântano sua mãe. Ela dança com a natureza e de forma harmoniosa observa os animais e faz paralelos com os homens. A natureza selvagem, indomada e bela se torna a melhor professora da protagonista.
Já crescida, quando dois jovens da cidade ficam intrigados com sua beleza selvagem, ela se permite experimentar uma nova vida — até que um deles é encontrado morto.
Não vou dar spoiler. Leia quando puder, pois já se tornou uma adaptação para o cinema.
O filme é dirigido por Olivia Newman com roteiro de Lucy Alibar. Um Lugar Bem Longe Daqui chega em 24 de junho de 2022 nos cinemas.
Estou ansiosa para ver o filme!
Quando se deu conta de o quão longe havia viajado, se perguntou se ainda havia um caminho de volta para casa.
Tara vive totalmente isolada do mundo – como conhecemos. Nas montanhas juntamente com sua família religiosa sem ninguém para oferecer uma educação formal, ou para proteger a jovem dos ataques violentos de um irmão mais velho.

O mundo dela se transforma quando o irmão mais velho sai de casa e decide ir para a universidade. De repente um universo de possibilidades se desdobra e ela muda completamente de vida.
A história, narrada em primeira pessoa, é real.
O que mais me impressionou não foi a crença veja do pai, mas o fato de que isso aconteceu há muito pouco tempo.
Além disso, veio a confirmação de como o conhecimento é uma jornada libertadora, quanto mais lemos, estudamos e nos aprimoramos mais o mundo fica interessante.
Descobrimos, dentre outras coisas, que pouco ou nada sabemos.
A curiosidade, uma vez aguçada, nunca mais se encolhe. E, de fato, o caminho de volta nunca mais será o mesmo.
Tem que doer, do mesmo jeito que um rio precisa fluir, e a chama queimar. Ela me lembra, cruel, que sou composta de partículas de matéria que morrem a cada segundo. Alguém consegue se acostumar com isso? Aprender a viver com isso assim como as pessoas que vivem na cidade de Oswiecim (que abrigou Auschwitz) ou Hiroshima sem pensar jamais no que aconteceu lá no passado. Elas simplesmente vivem suas vidas.
O livro foi publicado em 2009, mas em 2018 foi indicado ao Nobel de Literatura.
Olga Tokarczuk traz como protagonista uma senhora idosa e solitária, professora de inglês aposentada que ama astrologia e William Blake.
Ela vive numa remota região da Polônia e prefere a companhia de animais a de pessoas – evita usar nomes próprios ao se referir a elas. Assim os vizinhos ganham alcunhas como: Esquisito ou ainda Pé Grande.
Janina só toma chá preto e o amor pelos animais faz com ela escreva cartas a polícia denunciando maus tratos e criando várias teorias. O que a torna persona non grata.
A narração é em primeira pessoa, então se você se identifica com os temas narrados poderá concordar com a maioria dos relatos, ainda que sejam um tanto excêntricos.
Entretanto, se temas como astrologia ou poesia te entendiam você pode pular as partes do livro para seguir com mais fluidez.
Dentre os vários tópicos narrados o recorrente é o envelhecimento.
A velhice é tratada de uma forma singela, já que é o reflexo da narradora, uma senhora que vive sozinha com suas moléstias no meio do nada; embora Janina não aja como uma velhinha indefesa e seja, de fato, bem diferente daquilo que é esperado de uma senhora idosa.
As mortes, o ambiente em si, os personagens e a forma como tudo se manifesta e como o tempo passa na história, apenas realçam o envelhecimento e os sentimentos experienciados nesse período.
Um livro denso e um tanto sombrio, mas eu gostei muito.
O título esconde o tema central da história.
Atenção: spoiler.
O ano do pensamento mágico conta a história de Joan quando ela presenciou a morte do marido enquanto temperava uma salada, às vésperas do ano novo em 2003.
E segue com a morte da filha, após alguns meses depois do marido, a filha adotiva cai no aeroporto de Los Angeles e morre em função do traumatismo craniano.
É um mix de autobiografia e memória. A morte, uma vizinha conhecida por todos, é o tema central, mas não só.
O que o luto pode trazer para alguém? Que desenrolar acontecerá?
Ela escreve um artigo pela primeira vez depois de anos, e fica perplexa com a quantidade de erros cometidos durante o processo. E se questiona:
Disse a mim mesma que aquilo era mais uma evidência dos déficits cognitivos que vinham com o sofrimento pela perda, mas continuei inquieta. Será que um dia voltaria a confiar em mim novamente?”
A narrativa é o processo de luto da autora, mas de forma ordenada. Como se escrever pudesse trazer alguma ordem ao caos que estava a sua volta. Experiência recente, que pulsa e sangra.
É possível não sucumbir?
Morte e vida, miudezas do dia a dia, dor, amor e sofrimento. É um livro poderoso, cheio de ensinamentos e fala ao coração de todos, especialmente em tempos de pandemia.
Quem nunca viveu um luto?
Os livros mencionados carregam temas universais como morte, velhice e abandono. Talvez por isso sejam tão interessantes.
O conteúdo pode ser pesado, contudo, é sensacional terminar uma leitura e pensar largamente sobre a obra. Ela gruda, marca e gera inúmeros questionamentos sobre nossa própria vida.
Leitura boa é a que nos faz refletir.
Espero que você tenha uma ótima experiência lendo as obras acima indicadas. E, depois passe por aqui com seu comentário, pode ser?
Boa jornada lendo mais em 2022.